Dicendi

22/01/09

O SAHARA

A areia do Sahara não se conseguia perder de vista. A noite começava a cair e a ajuda só viria no dia seguinte, quando o Sol estivesse alto. John e Amy teriam de ficar isolados naquele lugar, esperando que o dia nascesse.
- John! Só temos uma alternativa. É tentarmos montar a tenda que está lá atrás. O que achas?
- Mas… é uma Andre Jamet... não é antiga?
- Tens razão John, só tem um quarto. Como fazemos?

- Eu monto a tenda. Dormes lá tu. Eu passo a noite no Jeep e sempre vou deitando o olho à nossa volta, vendo se não corremos perigo.
- John... eu não quero dormir só... tenho medo... Tu já sabes que até te peço para ires comigo ao carro, quando o estaciono longe... sabes que tenho receio de ficar sozinha.
- Ok... Ok... dormimos juntos... Sabes se há sacos de cama lá atrás?
-Não sei John... espera... deixa-me ir ver...
- Amy! Então... estás a demorar-te tanto porquê?
Amy tendo encontrado dois sacos de cama, enterrava desesperadamente um, sem que John desse por isso. John ia alisando a areia, espetando as estacas... um trabalho árduo.
- Desculpa John... isto estava tudo desorganizado... descobri uma lanterna a petróleo e "um" saco de cama. Deixa-me verificar melhor... Um! Só temos um saco de cama... devo-me ter esquecido do outro, ou então ficou na garagem...
- Ok...ok... não faz mal... eu cubro-me com qualquer coisa.

Enquanto John montava a tenda, Amy ia ajudando noutras tarefas, deitando o olho ao saco de cama mal enterrado, onde uma ponta teimava em permanecer à superfície.

Eram já 01:14 pm, a tenda finalmente erguia-se em direcção ao céu. Uma brisa, fresca, passava-lhes pelos cabelos. Fecharam o Jeep, recolheram os objectos pessoais. Para Amy, o deserto não lhe guardava segredos, e aquele vento frio, significava que a seguir o cenário seria pior. Algo mais forte se aproximava.
- John, tens a certeza que a tenda está bem presa?
- Fogo... Amy... para a próxima armas tu a tenda. Claro que está bem presa. Disse ele enervado.
- Ok... não te irrites. Só que está para vir aí ventos fortes... vamos ter tempestade... acredita... já vi isto algures... eu sei.

Entraram na tenda. John puxou de uma caixa de fósforos e tentou desesperadamente ligar o candeeiro a petróleo, enquanto Amy preparava a cama para dormir. Uma primeira rajada de vento faz abanar a tenda, fortemente.

- John... aqui não fico. Talvez prefira dormir no Jeep
- Vais para o Jeep? Perguntou John desesperado.
- Vou sim, com esta tempestade que se aproxima não quero passar a noite na tenda.
- És terrível... depois de eu perder uma hora a montar isto... Ok... que seja...
- Espera! Vou fazer o seguinte. Vou esvaziar os pneus ao Jeep, assim não abana tanto e ficamos mais seguros. O que te parece?
- Concordo. Diz Amy

De repente Amy lembra-se que tinha enterrado o saco de cama por entre os pneus traseiros do carro.

- John! Não! É melhor não... porque vamos perder muito tempo.
- Decide-te de uma vez por todas. Olha... queres que arme a tenda por cima do Jeep?
- Não! Porque tenho medo. E com a tempestade aí à porta temos de estar prontos para qualquer coisa. Deixa a tenda... é velha. Lembras-te?
- Ok. Vamos então. Entra primeiro.

Acomodaram-se, dentro do possível. O espaço não era dos mais desejados, mas dadas as circunstâncias até se coabitava bem. Num lugar inóspito como aquele, não restava outra alternativa.

Deitaram os bancos e aconchegaram-se. A noite ia alta, o vento roçava a chapa do Jeep, já gasto com os anos.

- John! Obrigado por seres assim. Foste um querido, preocupaste-te comigo. Sabias que eu tinha medo e depois daquele trabalho todo não me deixaste sozinha. Obrigada.
- Esquece isso. Isto dá-me forte, mas passa depressa. Nem eu dormiria descansado sabendo que estavas sozinha, receosa.
- Gosto tanto de ti. Parece que te conheço há anos.
- Eu sei. Sinto o mesmo.
- John. Tenho frio. Posso encostar-me a ti?

John levantou o cobertor e encostou-se a Amy. Olharam um para o outro, sorriram. Permaneceram breves minutos ouvindo o vento e vendo a areia a bater no vidro… a única parte por onde era possível ver para o exterior, era a marca deixada pelos pára-brisas no vidro dianteiro. Tentaram adormecer, mas o sono não aparecia. John agarrou as mãos de Amy e deu-lhe carinhosamente um beijo na face. Amy sorriu, retribuindo a ternura que lhe era apanágio. John segurou-lhe a cabeça e beijou-a nos lábios. Estiveram assim alguns momentos. A tempestade tinha sido relegada para segundo plano. Por entre carícias e beijos o ambiente ia-se moldando ao desejo, que timidamente se escondia por debaixo do cobertor.

Acordaram no dia seguinte, na mesma posição com que tinham adormecido, agarrados um ao outro. Afinal nem tudo foi mau naquela noite. Apesar da intempérie e do condicionalismo de terem que pernoitar em pleno deserto, isso foi esquecido, com momentos ímpares, da mais pura magia e química. Não dá para esquecer, porque momentos como estes, quando feitos com a pessoa certa são para sempre, perpetuados no livro da memória. Assim foi, e foi bem.

posted by Henrique at 22:50

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