Dicendi

30/03/09

BEIJO

Beijo, esse gesto
que enlouquece
enternece e abraça
Dois lábios
Sábios
que a boca entrelaça
Fugazes, audazes
atalham caminho
até ao coração
Beijo
Molhado, colado
que a língua não poupa
Subtis na atitude
de a deixar louca
nesse momento, desejado
Beijo
Tu que caminhas
pelo desconhecido
Que não sabes
o que vais encontrar
Adivinhas!?
Que te sirva de aviso
Não te voltarei a lembrar
posted by Henrique at 22:00

29/03/09

IN TEMPORE

Que nome te hei-de dar
para que nunca te esqueças de mim
Palavras que o tempo teimou em levar
Foram poucas, curtas, mas intensas
Talvez perdidas pelo caminho,
que tardei em encontrar
O toque e olhar estão depositados em ti
como se alguma vez tivessem acontecido
Enquanto a minha mão desliza,
suavemente pela tua face
os meus olhos cruzam os teus, com meiguice
Sinto o respirar, no aconchego de um abraço
É um momento, como tantos outros
Em que te imagino
O vento passa por nós e empurra-nos
Contra o pensamento
De uma forma avassaladora
Um rio, uma ponte que nos separa da eternidade
Uma água que corre entre nós
Um carinho e uma saudade
Que faz de ontem o agora
É assim, uma forma de ser e de estar
Que, como comecei
Não sei!
Que nome te hei-de dar
posted by Henrique at 16:05

18/03/09

ENTREVISTA COM O DIABO

Não sei bem o que se passou comigo naquela manhã de Dezembro, só sei que andava eu pelas ruas da Baixa, quando de repente senti uma pancada na cabeça.

Tentei levantar-me, mas não consegui mexer um dedo. Pensei: - Ok! Toni, estás morto! E estava mesmo. Mas porquê? O que realmente aconteceu? Bom, ouvi dizer que quando uma pessoa morre se eleva no espaço, libertando-se do corpo. Foi o que aconteceu, vi-me a subir no ar e foi nesse momento que reparei, que no meu corpo, inerte, estava um semáforo em cima das minhas costas. Pela confusão instalada apercebi-me que tinha sido um autocarro de dois andares, cabriolet, daqueles que levam os turistas às zonas mais engraçadinhas de Lisboa. O impacto foi de tal maneira forte que havia turistas e máquinas fotográficas espalhadas por todos os lados.

Nesta minha viagem inesperada entrei por um túnel. Ainda pensei que... se não ia para o céu, por que é que tinha de ir pelo túnel do Rossio para o inferno.

Aquilo fez-se bem, e rápido, momentos depois estava à entrada de um portão enorme, em ferro, com umas lanças que mais pareciam espetos, numa qualquer casa de frangos assados. Havia uma fila enorme de homens e mulheres, trocavam-se olhares, sorrisos e alguns até choravam. Tirei uma senha vermelha com o n.º 123.456. Pensei para comigo - Parece-me pouca gente! Só mais tarde é que vi um placar que tinha a seguinte legenda: "MORTE POR ACIDENTE - Abertas inscrições para os que morreram entre as 12H45 e as 12H46".

Sentei-me numa cadeira e esperei calmamente a minha vez. Ao fim de duas horas ouvi um berro.
- António de Jesus!!!!
- Sou eu. Respondi ainda mais alto.
- Dirija-se ao gabinete n.º 2.
E lá fui eu. Quando cheguei ao gabinete a porta encontrava-se fechada, bati, voltei a bater e... entrei, pois claro. Apareceu um homem que me mandou sentar.
Eu simulei ficar impávido, mas o sangue fervia-me nas artérias, precipitando-se para os órgãos previsíveis. Quando o homem regressou trazia com ele um tipo meio esquisito que mais parecia o diabo. Parecia não, era mesmo o gajo em pessoa.
Diabo: Você tem aqui um lindo currículo, sim senhor. Receio que não tenha boas novidades para si.
Toni: Mas olhe que esse currículo está adulterado. É de um vizinho meu, que me pediu para eu enviar para umas pizzarias. Veja lá que o gajo nem carta de mota tem.
Diabo: Sim... sim... irrelevante meu caro, irrelevante.
Toni: Eu sempre fui um homem honesto, amigo dos animais. Nunca roubei, nem menti...
Diabo: Ai sim!!! Então e o que é isto aqui? Deixe-me ler melhor... pois... abandonou um local de acidente, fugiu à polícia... bem... por aí... por aí...
Toni: Nada disso. Eu vou contar-lhe como aconteceu. Um condutor que circulava numa cadeira de rodas entrou em contramão num acesso à A1, no sentido Lisboa-Porto. Eu que vinha a conduzir o meu camião, descansadinho, a falar com um amigo meu pelo telemóvel, quando reparei no gajo da cadeira de rodas não consegui evitar o acidente.
O condutor da cadeira de rodas depois de colidir comigo a grande velocidade ainda se pôs em fuga. A GNR quando chegou ao local, depois de eu ter contado o sucedido, ainda confirmou que tinha visto um condutor numa cadeira de rodas a fazer sinais de luzes e a acenar.
Diabo: Hummm... isso parece-me história.
Toni: Juro-lhe. Até lhe digo mais, lembro-me perfeitamente das horas que eram, porque o relógio está parado há 5 anos e os ponteiros não avançam nem um segundo.
Diabo: Bom, Sr. António de Jesus... Epá... este apelido aqui no inferno não me agrada... Quem foi o autor de tal apelido?
Toni: A minha mãe, sr. Diabo.
Diabo: Como é que ela se chama?
Toni: Chamava-se Maria de Fátima.
Diabo: Estamos pior... Vou ter de lhe ler a sentença.
Toni: Espere!! O meu pai é que era um santo. Chamava-se Luís Judas.
Diabo: Ah! Esse apelido soa-me bem. O que é que o seu pai fazia na vida?
Toni: Era carpinteiro.
Diabo: ???? Carpinteiro????
Toni: Sim. Mas era só ajudante. Segurava nos pregos enquanto o outro martelava.
Diabo: Já estou farto de si homem. O que quer fazer aqui em cima?
Toni: Não sei ainda. Aqui ganha-se bem? Ou nem por isso?
Diabo: Paga-se pouco, mas se for ali para a porta do lado, onde andam os anjinhos... não ganha nada. Agora escolha. Onde quer ficar?
Toni: Fico aqui. Qual é a minha pena?
Diabo: Vai ser condenado à morte.
Toni: Outra vez?
Diabo: Já tinha sido antes?
Toni: Não. Mas em pouco tempo é a 2.ª vez que vou morrer. Quando é que a sentença vai ser executada?
Diabo: Hoje.
Toni: Seja, então. Como vai ser?
Diabo: Com Cicuta.
Toni: Está bem. Pelo menos é diferente.
O diabo toca um pequeno sino que tem na secretária, um homem aparece com um copo de água na mão.
Diabo: Tome, beba e mexa bem, que às vezes o veneno fica no fundo.
posted by Henrique at 22:00

06/03/09

PODEMOS RIR? DEVEMOS...

Rir faz bem... dizem. Eu concordo, mas isso sou eu, que sou bem disposto. Há pessoas que para mostrarem um dente só mesmo quando vão ao dentista... e às vezes até lá vão para os arrancar... pois... quantos menos dentes melhor... mais curto é o sorriso.

Até podemos discutir a sorrir.
- Epá... Já me estás a aborrecer; daqui a pouco dou-te uma lambada.
- Mas porque te estás a rir?
- Porque sou um tipo bem disposto.
- E vais agredir-me assim? Com essa alegria toda?
- E então? O gajo que tem de chorar és tu.

Sorrir é tão bom. Mas cuidado! Há aquelas pessoas que se riem por tudo e por nada.

- Ah... e tal... estou-me a rir...
- Porquê?
- Por nada.

Só falta mesmo na nossa cultura um sorriso... uma alegria nos funerais, poderíamos começar por aí. Há países onde se dança, canta e festeja uma pessoa que vai a ombros com os pés para a frente.
- Estou tão contente. Morreu o Manel.
- A sério! Que máximo! E quando é o funeral?
- É amanhã. Leva cd's que eu levo o karaoke.

Isto sim, é qualidade de vida.
Algumas pessoas não se devem rir muito ou então inibem-se. Saliento os técnicos de prótese dentária. Não porque não possam ou não queiram, mas porque não deve ser fácil tirar e meter o sorriso na boca dos outros. É contra natura.

Já pensaram num debate político, com sorrisos de orelha a orelha? Se já é tão difícil levá-los a sério, imaginem essas criaturas a discutir o plano estratégico para a Saúde, ou a anunciarem-nos que o número da desempregados em Portugal aumentou consideravelmente! Tudo isto com sorrisos hilariantes.

Pensando bem, o melhor é a malta rir-se devagarinho... para não dar azo a tristezas.

Henri
posted by Henrique at 15:18

05/03/09

O SARCÓFAGO

Três amigos decidiram fazer uma viagem até ao Egipto. A egiptologia sempre os fascinou. Chegaram ao Cairo em Setembro de 2003, depois de uma viagem tão atribulada e longa, como qualquer crente, cumprindo uma promessa atirando-se pelas escadas do Bom Jesus de Braga. Marta era uma mulher agradavelmente desinibida, João tinha aquele ar de intelecto, mas era mesmo só o ar, e Pedro era o MacGyver do grupo. Nunca mais me esquece de uma vez, Pedro se ter atirado de um 10.º andar utilizando um saco do Pingo Doce como pára-quedas. Dizia ele que eram os únicos sacos que sendo pagos vinham já com buracos, para deixar passar o ar. Impressionante a visão deste homem.
Ficaram hospedados no Havana Hotel. Era um hotel razoável, com quatro estrelas, uma vista agradável sobre a cidade, casa de banho com banheira e tudo; a água que jorrava das torneiras até nem parecia de má qualidade, portanto podia-se manter os intestinos a funcionar com normalidade. Pousaram as malas, agarraram nos mapas que tinham trazido de Lisboa e fizeram-se à cidade.
Pedro: Epá… o que vocês acham, se fossemos petiscar qualquer coisa? Ninguém disse nada. Olharam uns para os outros, arregalaram os olhos e responderam: - Concordo. E é já. Atreveram-se pelas ruas da cidade na expectativa de encontrarem um restaurante.
Marta: Rapazes! Olhem ali o McDonald’s. Vamos lá?
- Nem penses. Respondeu o João. Achas que me vou meter nisso aqui? Deixa-te mas é de ideias tolas senão daqui a pouco ainda dizes que te apetece umas pataniscas.
- Eu aqui só alinho em comida da região. Atirou o Pedro.
A fome era já tanta que os olhos não aguentaram e deram logo de caras com o Naguib Mahfouz, um restaurante, uma referência gastronómica do Cairo. Aquilo parecia um palácio. Vejam lá bem o que faz a fome.
Pedro: João! Tens terrenos para vender? É que acho que vais ter de te desfazer dessas terras para pagar aqui o jantar.
João: Nem penses. Vou para o mais baratinho. Como sabes, a comida no Egipto é dada a muitas especiarias, portanto não me está a apetecer ingerir uma quantidade de alimentos que depois me façam desconfigurar o sistema intestinal.
Marta: Epá… a malta sabe o que é isso. Há dias em que te conhecemos à distância. Sorriu.
Sentaram-se numa mesa junto a uma janela que dava para um jardim interior fabuloso. Chamaram o empregado, que delicadamente lhes fornecer o menu.
Pedro: Não percebo nada disto. Acho que vou pedir Kebab. Já li que este prato é muito semelhante à nossa comida.

Marta: Onde é que leste isso?
Pedro: Foi numa revista de culinária que estava no supermercado. Aquilo até tem castanhas. Portanto castanhas… Está a ver! Castanhas...Portugal...Portugal...Castanheiros e castanhas Kebab. Certo?
João: Pedro! Trouxeste os comprimidos? É que da última vez que viajámos juntos confundiste uma bomba de gasolina com um chafariz. Lembras-te?
Pedro: Lembro. Mas isso foi porque não estava sinalizado.
Demoraram duas horas a jantar e outras duas para se conformarem com o pagamento. No dia seguinte deslocaram-se à recepção do hotel e pediram informações sobre visitas ao Vale dos Reis, principal necrópole real do Império Novo do antigo Egipto, possui 62 túmulos dos faraós desse período e também os túmulos dos faraós Tutankamon, Ramsés IX, Seti I, Ramsés VI e o de Horemheb. Ainda hoje se continuam a retirar jóias dos túmulos dos filhos de Ramsés II. Até há quem diga que aquilo nasce tudo ali. O Egipto é um dos países mais populosos de África, com cerca de 80 milhões de habitantes, mas estes são os que andam à superfície. Imaginem os que ainda estão enterrados. Fabuloso.
Viram chegar um autocarro com aspecto turístico, pelos menos faltava-lhe algumas partes da chapa, que dava aquele ar de descapotável, propício para se tirarem umas fotografias com grandes angulares. Ao fim de umas horas não se via sinal do Vale dos Reis.
Marta: Será que nos enganámos no autocarro?
Pedro: Admira-te. Estás sempre a fazer isso em Lisboa. Ahahahah… agora de repente lembrei-me daquela vez em que querias apanhar o autocarro para Algès e foste ter ao Barreiro. É parecido.
Marta: Não sejas parvo Pedro. Isso foi porque nesse dia eu tinha ido ao ginecologista e ainda vinha meio desorientada. Sabes como são estas coisas.
João: Epá! Estou a ver ao longe três coisas esquisitas. Parecem Toblerones apontados ao céu. Impressionante esta associação. A capacidade intelectual que João coloca nas suas observações.
Pedro: Mas… mas aquilo são as pirâmides de Gizé!!!
Marta: Mau. Já não estou a perceber nada. Mas não íamos para o Vale de Judeus?
Pedro: Judeus? Vale dos Reis, Marta. Vale dos Reis… cappicci?
Marta: Ah! Então quer dizer que o Vale de Judeus fica na parte oriental e o Vale dos Reis na Ocidental. É isso?
João: Não, minha querida. O Vale de Judeus fica em Alcoentre. Enquanto que no Vale dos Reis, se abrires a porta de um túmulo não te aparece ninguém, no Vale de Judeus se abrires um portão os gajos começam logo a cavar de lá para fora. Mais uma arrancada deste génio que não deixa de nos surpreender.
Chegados às pirâmides de Gizé apareceu logo um homem velho, vestido com umas fitas de linho brancas, que lhe enrolavam o corpinho todo. Estabeleceu-se logo ali uma reunião comercial, acabando por resultar na compra de um mapa desenhado em papel de jornal, com uns caracteres meio estranhos. Dizia-se um conhecedor da área, nomeadamente nas profundezas das pirâmides. João ficou fascinado com aqueles desenhos esquisitos. Agarrou no mapa e passou por uma entrada barrenta. Os outros seguiram-no. Pudera.
João: Vocês já viram bem estes desenhos nas paredes? Foi aqui que tudo nasceu.
Pedro: Como assim? Mas nasceu o quê?
João: Foi aqui que nasceu a construção civil. Já viram bem o que é meter calhau sobre calhau até lá cima?
Marta: Vamos fazer o seguinte. Ligamos as lanternas e separamo-nos, depois daqui a meia hora voltamos a encontrarmo-nos aqui. Assim quando nos reunirmos podemos salientar os aspectos mais relevantes que cada um viu. Depois voltamos a vê-los em conjunto.
Pedro: Concordo. Mas… E se nos perdemos? Como fazemos. Gritamos? E o eco que isto faz?
Marta: Nada disso, Pedro. Se isso acontecer fazemos sinal com a lanterna três vezes.
João: Mas Marta, por favor não tremas.
Ao fim de quinze minutos de se terem separado, João andava perdido num labirinto. Dava voltas e mais voltas, ia ter sempre ao mesmo lugar. Até que meteu a cabeça a funcionar. Deixou a lanterna acesa no fim do corredor, acendeu o isqueiro e dirigiu-se para a outra extremidade. Assim poderia ser visto de dois lados. Mas a vida de um génio não é nada fácil, é como os isqueiros, apagam-se. E de repente João ficou às escuras, nem lanterna, nem isqueiro.
Marta! Pedro! Estou aqui, por favor acudam-me.
Nada. Nem sombra deles (esta da sombra às escuras não é fácil, mas tem de ser…)
Ao tentar encostar-se a uma parede ouviu um barulho. Uma porta abriu-se. João caiu sensivelmente três a quatro metros em direcção ao desconhecido. Levantou-se atirou uma asneira para o ar que se ouviu algumas 100 vezes (chama-se eco... o eco). Reparou num buraco no tecto que deixava passar uma réstia de luz e iluminava de forma deficiente o local onde se encontrava. À sua frente estava um pequeno templo, dourado, com quatro leões de boca aberta. Havia um que já lhe faltava um dente. Isto das cáries não perdoa. João esgueirou-se sorrateiramente até ao templo e viu que lá dentro estava um boneco. Parecia uma Matriochka, aquelas bonecas russas que saem umas dentro das outras. Até parecem iguais, mas não são, porque para saírem umas dentro de outras têm de ser mais pequenas (isto tem de ficar bem claro).
- Afinal as Matriochkas não nasceram na Rússia ou então os russos viveram aqui antes dos egípcios. Disse baixinho.
Aproximou-se do boneco, bateu-lhe com uma das mãos e aquilo soou-lhe a oco. Meteu-se de joelhos e com força arrastou-o para fora do túmulo.
- É um sarcófago! É um sarcófago! E parece estar cheio. Vou abrir isto.
Viu uma pedra grande ao canto da câmara e deu-lhe com ela várias vezes, no sarcófago, claro. Fez-lhe um buraco entre a cor azul e a vermelha (ele sempre foi muito meticuloso). Levantou a tampa e ficou estupefacto. Lá dentro encontrava-se outro sarcófago, mais pequeno. Mais uma pedrada bem dada, desta vez ao meio do boneco. Saltou-lhe logo a tampa (reparem que estamos a falar do boneco), para deixar a descoberto ainda mais um sarcófago, desta vez muito pequeno. Com uma das mãos agarrou-o, virou-o para a luz que vinha do tecto e decidiu abri-lo, uma vez mais, mas desta vez sem a pedra. Abriu a boca de espanto. Lá dentro estava um pedaço de papiro e um palito. João abriu o pedaço de papiro e tentou decifrar aqueles caracteres, recorrendo ao pequeno dicionário que trazia no bolso.
“Este pequeno palito foi usado por Kufu na sua última refeição”. Dizia a inscrição.
João guardou ambos e esperou que alguém aparecesse, para anunciar a sua descoberta ao mundo. O Palito de Kufu.
Até hoje nunca mais se soube desses três amigos, nem do que o destino lhes reservou. Consta-se por aí, que anos mais tarde um arqueólogo encontrou numa das pirâmides os corpos de dois jovens agarrados a duas lanternas. Tudo indica que morreram a fazer sinais de luzes.
posted by Henrique at 19:49

O RETRATO

Enquanto olhava pelos vidros da janela do meu quarto, verifiquei que algo estava diferente nesse dia, o verde das árvores pintava o horizonte de uma forma deslumbrante, a estrada em terra barrenta que o atravessava desenhava um traço, numa beleza inconfundível.

Lembrei-me que tinha tudo ali, bem à minha frente, para poder fazer uma coisa que há muito estava guardada, à espera daquele momento. Pintar. Puxei o cavalete, instalei a tela e misturei as cores. De repente um pássaro negro pousou na soleira da janela, ficou ali, estático, durante uns minutos, observando atentamente todos os meus movimentos. Enquanto esboçava os primeiros traços lembrei-me da última vez que o tinha feito, e tinha sido há tanto tempo. Nessa altura, no bosque que agora me entrava pela janela, enquanto eu estava sentado num banco, que ainda existe, passou uma mulher, esbelta e com um olhar tão profundo que me deixou preso às ripas verdes do banco. Sentou-se em frente a mim, junto ao bebedouro, de água tão cristalina e aveludada… como ela. Perguntou-me, docemente, se eu não a podia pintar, fazer-lhe um retrato. Acedi imediatamente, afinal não era todos os dias que me deparava com alguém assim… aquele olhar. Vou descrever-vos o desenho. Pintei o fundo a verde, um verde forte. Aos seus cabelos negros dei-lhe liberdade, soltos ao vento, ao seu rosto exótico atribui-lhe uma cor pálida, onde os lábios vermelhos contrastavam com o castanho dos olhos. Pedi-lhe que deixasse descair o manto, queria que os seus seios ficassem retratados, não fazia sentido escondê-los, se bonitos eram…. E eram. Demorei três horas, até que terminasse. Quando lhe entreguei a pintura, abraçou-me fortemente, beijou-me e disse-me que nunca ninguém lhe tinha feito um gesto daqueles… um retrato. Senti-me orgulhoso, não pelo desenho, mas por ela, pela sua humildade… pelo seu toque místico. Dirigi-me ao bebedouro, bebi dois tragos de água e, quando me virei reparei que estava sozinho. Olhei para o chão e lá estava um manto, negro… apenas. Nem tive tempo de me despedir dela. Até hoje, nunca mais a vi, mas a sua imagem ficou-me gravada. Nunca esqueço um quadro que pinto. E hoje, ao abrir a janela, vendo o mesmo bosque, de um verde-escuro e os mesmos bancos reportei-me àquele dia de uma forma nostálgica, sentida. Apenas o pássaro negro permanece na soleira da minha janela, como se me quisesse pedir para o pintar, mas que por medo de ter que se ir embora, eu não tivesse oportunidade de me despedir dele. E assim foi. Não pediu, mas eu pintei-o na mesma. Partiu… voou em direcção às árvores, deixando-me uma pena… preta.
posted by Henrique at 15:56

04/03/09

EU SOU ASSIM...

Eu sou assim
Como me imaginas

Como uma nuvem que passa
Como uma brisa que vai e retorna

Ao teu leito

Eu sou assim

Como gostas de me ler e sentir
Nas palavras que vão ao teu encontro
Num sussurro, num assoprar de leve

Eu sou assim

Efémero, que aparece na tua sombra

Que persegue os teus passos
E te cola um beijo com um abraço

Eu sou assim

Como a vida, que corre contra o tempo

No momento, em que o vento
Me projecta no teu peito
Eu sou assim

Como me olhas

No fundo da tua alma

Onde a tua consciência me nega

E o teu pensamento me deseja
Serei sempre assim
Enquanto me lembrar

Que não poderei ser, de outra forma

Enquanto existir alguém, como tu

Que me faça sonhar

Será sempre assim

Até ao fim

No limite da minha insignificância

Que tu, que estás algures

Me possas fazer dançar na chuva
E ao olhares a lua me convides

Para um longo beijo
posted by Henrique at 15:36

03/03/09

A DANÇA

Ainda vens a tempo, disse
Olhaste, esperaste e... avançaste

Puxei-te contra o meu peito

Colámo-nos um no outro

Ao ritmo desenfreado

De uma dança

Que balança

Sob um céu iluminado

Os meus passos ligam-se aos teus

O tempo passa devagar

Num enrolar de sensações

A música que nos percorre o corpo

Em cadências suaves

Eleva-me ao teu encanto

Estou por minha conta

Hei-de sobreviver ao teu amor

Pensas que sou forte, nao sou

Ao ver-te dançar, esta dança

Sinto-me pequeno, impotente

Perante a tua magia,
Que se alia
ao êxtase de te ver bailar
E danças... envolta em véus opacos

Enaltecida pela chama, que em ti arde

Ainda estás a tempo,disse

De uma dança

Como se fosses uma bailarina

Que os meus braços erguessem no ar
posted by Henrique at 21:28

02/03/09

À DISTÂNCIA DE UM PENSAMENTO

O tempo correu contra mim
Nunca esqueci o teu sorriso,
acompanhado de uma lágrima
Que teimava em escorregar-te, pela cara
Parti deixando outra metade de mim
Vim à janela, apenas para te deitar, um último olhar
A tua imagem foi-se desvanecendo
Gritei por ti, mas não me ouviste
O meu peito, quase que explodia
Sentia-me perdido, sem coragem para continuar
Lembrava-me do que tinha deixado para trás
De não me ter despedido como queria
Ia para longe, para voltar um dia
À noite ouvi a tua voz, a chamar por mim
Choravas, choravas por te sentires tão sozinha
Disseste que o teu amor nunca tinha morrido
Para voltar, que estavas à minha espera
Que eu podia arranjar trabalho mais perto
Que podíamos andar de mãos dadas de novo
Correndo pelos campos, pela floresta
Esperei o dia nascer
E corri, corri deixando tudo para trás
Apanhei o mesmo comboio e olhei pela janela
A mesma onde me viste partir
Meti a chave à porta e entrei
Estavas no nosso quarto, sentada na cama
Apoiei-me nos teus joelhos
Baixei a cabeça e chorei
posted by Henrique at 23:45